Somos diferentes entre nós: alta sensibilidade, introversão e extroversão
Todas as pessoas altamente sensíveis são introvertidas ou elas também podem ser extrovertidas?
Por Rosalira dos Santos
Confesso que este é um artigo que há muito tempo eu desejava escrever. Um dos motivos é fato de que considero este um dos aspectos que mais diferencia as pessoas altamente sensíveis entre si. Outro motivo foram os comentários que recebi de algumas PAS extrovertidas. Estas pessoas têm o sentimento de que sempre que se escreve sobre alta sensibilidade há um direcionamento que acaba, implicitamente, privilegiando a versão introvertida do traço e criando uma espécie de retrato padrão de uma PAS: uma pessoa introvertida que gosta de estar sozinha; tem poucos amigos; prefere ambientes calmos e atividades introspectivas.
Embora este perfil corresponda à maioria das pessoas altamente sensíveis, ele certamente não dá conta do conjunto das pessoas que compartilham o traço. A verdade é que a alta sensibilidade não é a mesma coisa que introversão. E embora alguns de nós possam apresentar esta característica, nem todas as pessoas mais sensíveis são introvertidas. Uma das razões para esta confusão pode estar numa interpretação equivocada da necessidade – comum a todas as PAS – de passarem um tempo sozinhas a fim se recuperarem de períodos de hiperestimulação. Outra fonte de engano advém da percepção popular do que é extroversão, que costuma estar relacionada à determinadas características como: ter habilidades sociais, saber falar em público, ter muitos amigos, etc. E não é exatamente disto que se trata.
Mas então, o que significa extroversão?
Para responder a esta pergunta necessitamos esclarecer os termos que estamos usando. Afinal, o que queremos dizer quando dizemos que alguém (ou nós mesmos) é introvertido ou extrovertido? Boa parte dos estudos sobre estes tipos de atitude se baseia na abordagem desenvolvida pelo psicólogo suíço Carl Gustav Jung. De acordo com Jung cada indivíduo pode ser caracterizado como sendo primeiramente orientado para seu interior ou para o exterior. Sendo assim podemos dizer que a energia dos introvertidos se volta prioritariamente para seu mundo interno, enquanto a energia do extrovertido está mais focalizada no mundo externo. O primeiro tipo tende a voltar-se mais para dentro de si mesmo e absorver-se em seu mundo interior, já o segundo volta-se mais para fora, estando mais interessado no que aí ocorre do que nas suas experiências particulares
Vale salientar que na perspectiva junguiana ninguém é totalmente introvertido ou extrovertido. Todos temos estas duas tendências básicas em nossa personalidade, embora uma delas seja predominante em nossa atitude diante do mundo. O importante é deixar claro que quando falamos em introversão e extroversão estamos nos referenciando à maneira como cada pessoa recarrega sua energia.
Os tipos introvertidos se sentem energizados quando passam o tempo sozinhos ou com uma ou duas pessoas que conhecem bem. Eles gostam de ter tempo para refletir e pensar sobre ideias. Eles tendem a evitar situações sociais envolvendo muitas pessoas, não porque sejam tímidas ou medrosos, mas porque acham mais agradável participar de atividades mais tranquilas.
Os extrovertidos se energizam através do contato social. Eles gostam de estar envolvidos em muitos eventos e atividades sociais e se sentem excitados quando podem energizar os outros e fazer as coisas acontecerem. Normalmente, extrovertidos gostam de falar sobre as coisas como uma forma de tentar entender e lidar com os problemas.
Sempre vale a pena insistir no fato de que a personalidade de cada um de nós é composta por uma mistura, em diferentes graus, de introversão e extroversão. Ao contrário da alta sensibilidade que é uma categoria – o que significa que uma pessoa tem ou não tem esse traço – introversão/extroversão são polos de um continuum, ao longo do qual todos nos situamos. A maioria de nós realmente está em algum lugar no meio e possui alguns traços de cada um dos polos. Portanto, quando dizemos que uma pessoa é introvertida ou extrovertida estamos falando da predominância de uma ou outra atitude.
Certo, mas como isso se relaciona à alta sensibilidade?
Ah, ah, aqui temos aqui uma longa história. No seu livro “Use a Sensibilidade a seu Favor” a dra. Elaine Aron nos conta que ela mesma quando iniciou sua pesquisa sobre a alta sensibilidade, se perguntava se o traço que estava investigando não era, simplesmente, a introversão, tal como fora descrita por Jung. Foi no decorrer do trabalho que ela se deu conta de que tratava-se de duas coisas distintas e que a característica que estava estudando era algo mais complexo, onde a introversão poderia ou não estar presente.
A partir daí ela chegou à conclusão de que o traço da alta sensibilidade se baseava em um sistema neurossensorial mais sensível, sendo que uma pessoa poderia ter este sistema neurossensorial mais reativo quer fosse introvertida quer extrovertida. Uma pessoa altamente sensível apresenta uma grande tendência à saturação e à hiperestimulação por conta da enorme quantidade de informação captada pelo seu sistema neurossensorial. Esta é uma das características centrais do traço e é compartilhada por todas as PAS, independentemente de serem introvertidas ou extrovertidas. Na verdade, o mais provável é que uma PAS extrovertida se sature mais depressa, uma vez que a sua tendência é a de envolver-se com muitas pessoas e atividades pelo simples motivo que isto lhe dá prazer.
Portanto, ser ou não ser altamente sensível é algo que se determina, tão somente, pelo modo como o sistema nervoso capta e reage aos estímulos e não por qualquer tipo de atitude ou comportamento padronizado. Ser PAS é apenas mais um dos seus (ou dos meus) traços de personalidade e não define, de modo algum, tudo o que você é. Uma PAS é muito mais do que a sua alta sensibilidade, é uma pessoa com estória, talentos, predisposições e experiências próprias que moldam a sua personalidade. E é dentro desse conjunto que encontramos a predominância de uma atitude introvertida ou extrovertida, ambas possuindo suas vantagens e seus desafios.
Enquanto os introvertidos altamente sensíveis podem, por vezes, correr o risco de se tornarem demasiado retirados e isolados, os extrovertidos sensíveis podem facilmente ficar sobrecarregados pelo excesso de atividades sociais e não se darem conta da sua necessidade de repouso e solidão. As PAS extrovertidos desfrutam das atividades em grupo e gostam de conhecer novas pessoas, como todos os extrovertidos. Mas, diferentemente dos demais extrovertidos, necessitam de tempo sozinhas para se recuperarem da estimulação de estarem constantemente envolvidas com outras pessoas e eventos excitantes.
PAS extrovertidas: a minoria dentro da minoria
Tenho uma amiga, altamente sensível e extrovertida, que uma vez usou esta expressão: “somos a minoria dentro da minoria”. Embora a frase seja engraçada – e estatisticamente correta, já que segundo a dra. Aron, os extrovertidos representam cerca de 25% a 30% do conjunto das pessoas altamente sensíveis – traduz uma realidade que traz consigo algumas dificuldades.
Uma das primeiras dificuldades que sinto a partir do contato com este tipo de PAS (e não são poucas as que conheço) é não se sentirem plenamente representadas na descrição clássica da pessoa altamente sensível. Diferente das introvertidas, estas PAS frequentemente não sentem aquela sensação de ter se encontrado e de “estar em casa” ao deparar-se com o tema da alta sensibilidade. Há o reconhecimento do traço, mas há, também, um certo estranhamento e uma sensação de ainda não serem completamente compreendidas. Por quê? Porque mais uma vez não são como a maioria e a descrição tende a basear-se na maioria, ou seja, naqueles 70% das PAS que são introvertidas e se reconhecem sim, plenamente, em cada detalhe do retrato padrão de uma PAS.
Tive a ocasião de observar esta dinâmica em alguns dos encontros de PAS que organizei. Era interessante ver como às PAS extrovertidas lhes agradava compartilhar suas experiências e insights, enquanto suas contrapartes – as PAS introvertidas – necessitavam de mais tempo e estímulo para sentirem-se dispostas a falar sobre si. Nestas ocasiões pude sentir também uma diferença na forma como cada tipo reage a desafios. Enquanto as PAS introvertidas tendem a planejar cuidadosamente a maneira como vão lidar com uma situação nova, os extrovertidos altamente sensíveis revelam-se mais abertos ao improviso e mais dispostos a assumir riscos. Não é de estranhar que, com tudo isso, tendam a se sentir pouco representados no perfil típico de uma PAS.
Alerta: mesmo uma PAS extrovertida ainda é uma PAS
Acho extremamente importante enfatizar que uma PAS extrovertida compartilha as mesmas características que uma PAS introvertida. Entre elas a tendência para experimentar tudo de forma profunda e, potencialmente, hiperestimuladora, levando à necessidade de tempo de silêncio e períodos de “baixa estimulação”, para acalmar o seu extremamente reativo sistema neurossensorial.
Como resultado as PAS extrovertidas enfrentam desafios adicionais,normalmente não bem compreendidos pelas suas contrapartes introvertidas. O principal deles se traduz no fato de que, enquanto obtém grande parte da sua energia da interação social, também se sente hiperestimulada pelo excesso de interação e atividade. Então, o mesmo que “energiza” também pode levar à saturação, conforme comenta a própria dra. Aron se referindo às PAS extrovertidas como:
“Aqueles 30% irritantes de pessoas altamente sensíveis que se descreviam como falando muito, gostando de conhecer pessoas novas, de ter muitos amigos e desfrutar de grandes festas. Mesmo assim, eles eram como os outros 70% – sensíveis à dor, cafeína e ao ruído alto; não gostando de pressão; sentindo-se facilmente hiperestimulados e assim por diante. Então, eles também necessitavam de muito tempo de desconexão das outras pessoas, ao contrário da maioria dos extrovertidos.” (Fonte: psychologytoday.com)
Esta dualidade de impulsos – conexão e isolamento – faz com que um dos grandes desafios para um extrovertido altamente sensível seja o de encontrar (e manter) um equilíbrio entre o seu anseio por interação e experiências e sua necessidade de recolhimento para processar os muitos estímulos recebidos. Encontrar este equilíbrio torna-se especialmente difícil quando a PAS extrovertida não reconhece a própria sensibilidade. Neste caso, ela tenderá a se perguntar porque a maioria das outras pessoas extrovertidas parece estar muito menos exaurida depois de encontros intensos e muita interação social. Este tipo de comparação e o desejo de se igualar aos seus pares pode fazer com que a necessidade de descanso e de recolhimento seja, inicialmente, ignorada e, mais tarde, deixe de ser percebida. Esta atitude leva, inevitavelmente, à saturação e, quando os sinais de aviso não são respeitados, à doença e à exaustão. Por isso é especialmente importante para a PAS extrovertida desenvolver uma compreensão completa do traço e do seu impacto na sua vida diária.
Conhecer-se e respeitar seus limites: a “receita” para todos
A solução para o dilema é bastante simples, ainda que nem sempre seja fácil de implementar: trata-se de conhecer e aceitar o seu traço como uma parte – e uma parte extremamente importante – da sua personalidade. Muitas PAS, sejam introvertidas ou extrovertidas, desconhecem a sua sensibilidade particular e, portanto, muitas vezes extrapolam os seus limites na tentativa de se comportar da maneira que acreditam ser “normal”, ou seja, de acordo com a norma estabelecida para a maioria. O conhecimento de ser altamente sensível e das características associadas à alta sensibilidade podem ajudar a encontrar o seu equilíbrio, reconhecendo e respeitando os seus limites.
Para mim, o conhecimento da minha sensibilidade foi uma descoberta extremamente valiosa, pois me permitiu saber que não havia nada de errado comigo e que estava tudo ok com minha maneira de ser. Mesmo assim, o tema do equilíbrio continua a ser um grande desafio. E embora eu pratique, e sempre sugira aos meus clientes de coaching, uma rotina que apoia e respeita a minha sensibilidade, penso que não é aí que se encontra a chave para equilibrar a nossa vida como PAS.
Penso que a chave para uma vida de equilíbrio reside na aceitação da própria alteridade. Foi somente ao reconhecer que sou diferente da maioria – com outras necessidades e predileções – que eu pude me abrir para o autocuidado e para o reconhecimento dos meus limites. Com isso sinto-me mais apta a me permitir dar-me aquilo que preciso sem me sentir culpada, mesmo quando para isso preciso dizer não as necessidades (muitas vezes legítimas) das outras pessoas.
Assim, seja você uma PAS introvertida ou extrovertida, desejo-lhe sucesso nesta caminhada em busca do equilíbrio. Que você reconheça e aprecie sua personalidade única e que aprenda a aceitar suas peculiaridades. Que você se permita ser completamente você mesmo, especialmente em situações desafiadoras.
Se precisar de ajuda nesta jornada, contate comigo e conheça o PAS, meu programa de coaching para pessoas altamente sensíveis. Talvez explorar de maneira profunda a forma como a alta sensibilidade afeta você e sua vida seja o primeiro passo rumo ao desejado equilíbrio.
Feliz ano novo para você.
Beijos e bênçãos,
Rosalira dos Santos
Originalmente publicado em: Ame a Sua Sensibilidade
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Oi, meu nome é Rosalira Oliveira e eu sou a criadora deste site e do Programa Ame Sua Sensibilidade. Meu objetivo é ajudar pessoas altamente sensíveis a compreender e integrar esta característica, reconhecendo-a como um dom, tanto para elas mesmas quanto para as pessoas com as quais convivem. Por quê? Porque conheço bem a sensação de viver se sentindo diferente das demais pessoas, tendo a nítida impressão de que existe algo errado com você. Essa foi, por muito tempo, a minha história.