Altamente sensível, dar e receber. É possível um equilibro?
Quando se é altamente sensível, tende-se a ser um doador por excelência. Mas, ao mesmo tempo, possuir uma grande dificuldade em receber. O que acaba por gerar um profundo desequilíbrio. Como ajustar os pratos dessa balança?
Por: Rosalira de Oliveira
Este artigo foi originalmente postado em: Ame a Sua Sensibilidade
A maioria das pessoas altamente sensíveis é especialista em doação. Somos doadores por excelência. Doamos boa parte do nosso tempo, recursos, energia, escuta…. Por vezes doamos antes mesmo que os outros nos peçam. Basta identificarmos uma necessidade e lá estamos nós buscando um modo de saná-la. Por conta da nossa empatia tendemos a perceber facilmente o que os outros estão necessitando. Além disso também costumamos saber, intuitivamente, o que precisa ser feito para ajudar. Com tudo isso é frequente nos colocarmos no papel de doadores.
Esta generosidade e disposição para ajudar é uma das características associadas ao traço. Porém, em alguns casos, ela se torna excessiva, fazendo com que o ato de doar se converta numa verdadeira armadilha. São aqueles casos nos quais a pessoa se esgota, perde de vista as próprias necessidades e, não poucas vezes, acaba decepcionada e ressentida com aqueles a quem ajudou. Do outro lado, muitas PAS encontram grande dificuldade quando se trata de receber – quer seja um presente, um elogio, uma ajuda para lidar com um problema, etc. O simples fato de ser o objeto da atenção de alguém pode lhes causar constrangimento, sendo uma situação que fazem de tudo para evitar. Por que? “Não quero dar trabalho”, “Não gosto de incomodar” são as respostas que costumo ouvir dos meus clientes quando lhes pergunto a razão deste comportamento.
Nem é preciso comentar o fato de que esta postura que reflete um desequilíbrio profundo. Dar e receber de maneira equilibrada é vital não apenas para a manutenção da nossa saúde psíquica, como também, do próprio circuito da generosidade. É somente quando mantemos esse equilíbrio que nossa doação pode se tornar genuína e sustentável a longo prazo. Dar e receber são, portanto, momentos diferentes de um mesmo ciclo. Manter a energia estagnada em um desses polos costuma ser danoso para a maior parte das relações.
Os dois pratos da balança: o lado dar
Existem vários motivos que levam a este desequilibro. Um deles tem a ver com o viés cultural que supervaloriza a doação e mesmo, o autossacrifício, tidos como sinais de bondade e de elevação espiritual. Educados nessa tradição tendemos a ver o ato de dar como algo superior enquanto o receber passa a ser visto como menor, egoísta e não espiritualizado.
Não é preciso ir muito longe para observar os efeitos nefastos desse ideal cultural. Todos conhecemos ao menos uma daquelas pessoas que se sacrificam, doando mais do que podem e se transformam numa espécie de “credores emocionais”, sempre lembrando às pessoas próximas o quanto elas “lhes devem”. O que vemos nestes casos é um apelo distorcido por reciprocidade. Mesmo o mais abnegado dos doadores também deseja receber, ainda que, sob o peso do ideal da generosidade sem limites não seja capaz de expressar honestamente esta necessidade.
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No caso das PAS existem ainda outras razoes subjacentes ao nosso, quase irresistível, impulso de dar. Razões que quando não trazidas à luz da consciência, podem atuar como verdadeiras armadilhas, tanto para nós quanto para as pessoas com quem nos relacionamos. Uma delas diz respeito à confusão entre “ser necessário” e “ser amado”. Muitas PAS caem nessa armadilha, acreditando que a proximidade criada pela necessidade do outro é uma forma genuína de afeto. A armadilha aqui consiste no fato de que quando assumimos uma postura de “doação incondicional”, passamos a atrair pessoas que não estão interessadas em nós, mas sim, necessitadas daquilo que podemos oferecer. Essas pessoas tendem a se afastar quando sua necessidade foi satisfeita, ou quando já não podemos mais lhe dar aquilo que desejam, o que contribui para reforçar a percepção equivocada de que nosso valor reside naquilo que podemos propiciar às outras pessoas.
Outro perigo que ronda as PAS na relação entre dar e receber é utilizar a doação como uma forma sutil de pressão sobre o outro. Quando atuamos dessa maneira estabelecemos uma espécie de conta corrente mental na qual anotamos todos os nossos gestos de doação na expectativa da retribuição da forma que consideramos justa e adequada. O dar nesses casos deixa de ser um ato de generosidade e/ou de amor, para se transformar numa estratégia de manipulação e de controle. O grande problema aqui é que ninguém gosta de ser controlado e a tendência é que a outra pessoa reaja se negando a assumir o lugar de “devedor”.
E que tal receber?
Mas, como disse acima, há dois pratos nesta balança e é preciso estar atento para não sobrecarregar nenhum deles. Dar é importante e as pessoas altamente sensíveis, com sua generosidade e empatia, ajudam o mundo a ser um lugar melhor. Porém, há alguns poréns nessa estória. Em primeiro lugar é preciso que o ato de doar seja sustentável. Imagine uma despensa repleta de coisas boas: latas de tempo, pacotes de energia, sacolas de cuidado, caixas de palavras de apoio, etc. À cada vez que ativa seu modo “doador” você vai na despensa e retira algo. Como a despensa nunca é reabastecida, porque você não saber receber, pouco a pouco vai se esvaziando. Até não restar mais nada, nem para você e nem para os demais.
Cedo ou tarde o vazio começa a se fazer notar e seu corpo, que funciona como um sinalizador para suas necessidades físicas e emocionais, começa a dar sinais: cansaço, estresse, dores, preocupações, perda de sono…. Porém é possível que você não relacione as duas coisas e siga doando assim mesmo, se esforçando mais um pouco para dar conta de todas as obrigações e compromissos que acabou assumindo. Por vezes, é somente quando uma doença ou uma crise lhes obriga a parar que muitas PAS aprendem a cuidar de si mesmas.
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Mas manter sustentável o ato da doação não é o único motivo pelo qual você deve aprender a cuidar de si mesmo e preencher regularmente sua despensa com as dádivas da vida: descanso, tempo para si, amigos, amores, elogios, presentes, férias, ajuda nas dificuldades, etc. E nem mesmo é o principal. O motivo principal para que você receba com naturalidade todos esses dons é bem simples: você os merece, eles são seu direito. Não é necessário que faça nada para merecê-los, são seus pelo simples fato de você existir e ser quem é. Pensar que não é digno(a) e que necessita esforçar-se para ser amado(a) é uma das armadilhas do padrão de pensamento que chamamos crítico interior. É este padrão que nos mantém presos na armadilha de não conseguir receber, uma vez que, inconscientemente, estamos convencidos do nosso não merecimento. E “sabemos” disso. Podemos disfarçar esta convicção mascarando-a com sentimentos como orgulho, autossuficiência, independência ou mesmo do desejo (genuíno) de não incomodar, mas, no fundo, sabemos que é a crença no não merecimento que se esconde por trás da nossa atitude.
Dá para aprender?
Sempre dá. Essa é a maravilha da vida, sempre podemos mudar, crescer, aprender. Mas talvez, a verdadeira pergunta seja: “Eu quero mudar?” “Estou disposto(a) a largar a pseudossegurança da minha posição de doador e assumir a vulnerabilidade de saber que eu, como todo mundo, também preciso de ajuda para fazer frente aos desafios da vida?” Só você pode responder e não há uma resposta certa ou errada. Existem apenas as respostas verdadeiras. Se você deseja aprender a receber, e assim equilibrar estes dois aspectos na sua vida, talvez algumas dessas dicas possam lhe ser úteis.
Peça ajuda
Pedir ajuda não é feio. Pedir ajuda não é sinônimo de fraqueza. Pedir ajuda é jogar sua intenção para o Universo e permitir que surjam pessoas que podem colaborar com você. Quando você não pede mostra que não está aberto à ajuda. E o resultado é que ninguém parece se importar com você.
Aceite com alegria aquilo que lhe oferecem
Muitos de nós recusamos, as vezes de maneira automática, tudo que nos é oferecido.
“Quer uma ajuda?” Não, tá tudo bem”.
“Aceita um pedaço de bolo?” Não obrigado, estou bem”.
“Quer conversar sobre isso?” Não, tá tudo certo, obrigado”.
Eu já fui assim. Dizia que não queria incomodar, mas a verdade é que não queria me sentir devedora. Só mudei quando passei a ver os presentes que recebia da vida, através das outras pessoas, como uma maneira do Universo retribuir algo de bom que eu havia feito. Como disse uma das minhas clientes: “Tudo o que a gente faz retorna para nós”.
Esteja aberto(a) para enxergar as dádivas
Você não sabe como será esse retorno. Portanto, esteja aberto(a) ao que pode vir. Fique atento(a). Se alguém te convidar, vá. Se alguém lhe indicar, ligue. Se alguém te sugerir uma leitura, leia. Se alguém te chamar, escute. Se alguém te der uma dica, vá atrás dessa dica. Nunca se sabe o que pode estar escondido atrás dessas oportunidades. Se você recusa tudo simplesmente não abre espaço para receber o que a vida tem para lhe oferecer.
Seja verdadeiramente grato(a)
Quantas vezes esquecemos de ser gratos? Quantas vezes dizemos “obrigado” de forma automática, sem reparar naquilo que estamos recebendo? Quantas vezes desvalorizamos o que temos porque só conseguimos enxergar o que nos falta. A gratidão nos ensina a valorizar aquilo que recebemos e isso nos ajuda a perceber o quanto somos merecedores de afeto e como somos importantes para as pessoas com quem convivemos. Esta percepção ajuda a ampliar o nosso senso de merecimento e a aumentar a nossa autoestima. Com isso aprendemos a receber, tranquila e elegantemente, percebendo que dar e receber são apenas momentos diferentes do circuito de energia que nos vincula a todos.
Sobre a Autora:
Rosalira Oliveira
Rosalira Oliveira é a criadora do site e do Programa Ame Sua Sensibilidade, cujo objetivo é ajudar pessoas altamente sensíveis a compreender e integrar esta característica, reconhecendo-a como um dom, tanto para elas mesmas quanto para as pessoas com as quais convivem.
Oi, meu nome é Rosalira Oliveira e eu sou a criadora deste site e do Programa Ame Sua Sensibilidade. Meu objetivo é ajudar pessoas altamente sensíveis a compreender e integrar esta característica, reconhecendo-a como um dom, tanto para elas mesmas quanto para as pessoas com as quais convivem. Por quê? Porque conheço bem a sensação de viver se sentindo diferente das demais pessoas, tendo a nítida impressão de que existe algo errado com você. Essa foi, por muito tempo, a minha história.