Ser bom demais pode ser bem ruim – altamente sensível e ajudar a todo custo

Você está sempre a postos para resolver os problemas dos outros, mesmo que para isso precise se esgotar na tentativa de fazer malabarismos com seu tempo, energia, dinheiro, etc., sobrepondo o bem-estar dos demais ao seu próprio. Perceba quando ser bom para as outras pessoas pode significar que está a ser o contrário para você.

Por: Rosalira dos Santos

Ser bom demais pode ser bem ruim- altamente sensível e ajudar a todo custo

É um fato: pessoas altamente sensíveis costumam agir com compaixão e preocupação genuína pelo bem-estar dos outros. Por isso, muitas vezes parecem sempre disponíveis para emergências alheias. O carro do colega quebrou? Você oferece carona, mesmo que ele more longe. Sua irmã tem uma reunião importante? Você busca o sobrinho na escola, mesmo que precise sair mais cedo do trabalho. Seu cunhado teve uma despesa inesperada? Você empresta dinheiro, mesmo que isso comprometa o seu lazer.

A lista é longa. As situações mudam, mas o padrão se repete: você se desdobra para resolver os problemas dos outros, mesmo que isso custe sua energia, tempo ou bem-estar. Em muitos casos, acabamos confundindo “ser uma boa pessoa” com “nos deixarmos de lado”. Vamos enchendo os “saquinhos de bem-estar” dos outros, satisfazendo necessidades alheias, enquanto deixamos os nossos próprios vazios.

Cuidar dos outros não é errado. Pelo contrário, pode ser uma expressão bonita da empatia que caracteriza os altamente sensíveis. O problema surge quando essa ajuda vem do medo de não ser amado, da necessidade de agradar ou da culpa, e não de uma escolha livre. Quando nos sacrificamos automaticamente, sem perceber, deixamos de ajudar com o coração.

Esse padrão automático nos leva ao esgotamento e ao esquecimento de algo essencial: cuidar de nós mesmos. E aqui está o ponto crucial — ser um salvador nato não é um defeito. Mas se esse impulso vem da escassez, da baixa autoestima ou da falta de limites, precisamos repensar.

Ajudar sim, mas a partir da abundância, da liberdade e da consciência. Porque o verdadeiro cuidado com o outro começa no cuidado consigo mesmo.

Quando ajudar é ruim

A empatia, que faz parte do traço da alta sensibilidade, é uma característica maravilhosa. A compaixão pelos outros, a capacidade de se colocar no seu lugar e de compartilhar dos seus sentimentos são grandes dons. É desde este lugar de empatia que nós, PAS, nos dispomos a ajudar. Mas – e este é um grande mas – nossa ajuda só é verdadeira quando é dada a partir de um lugar de liberdade e de escolha.

E aí temos uma grande interrogação para as PAS: de onde vem o seu desejo de ajudar? De um lugar de liberdade, empatia e escolha consciente ou do lugar de uma reação automática, movida pela necessidade de agradar a todo custo? Acho que você sabe a que me refiro quando falo em reação automática: alguém expressa uma necessidade e, quando se dá conta, você já está comprometido(a) até o pescoço com o problema alheio. Algo semelhante ao que expressou esta PAS em um grupo de debates na internet:

A diferença entre doar-se e anular-se

“Quando penso nos tempos passados, tenho que admitir que eu quase não conseguia me distinguir das outras pessoas. E por isso estive cronicamente estressada durante anos. Não apenas eu sentia que tinha que responder a todos os pedidos com um ‘sim’, como eu mesma me oferecia para ajudar porque acreditava que a outra pessoa não tinha coragem de expressar verbalmente seu pedido.

Uma vez, uma amiga só teve que gemer: ‘No próximo sábado é o dia da minha mudança, nunca conseguirei arrumar tudo a tempo’ e eu me ouvi dizer imediatamente: ‘Eu vou te ajudar!’ No sábado seguinte – ao invés de me recuperar da semana de trabalho – eu me vi cansada e suada, colocando objetos alheios dentro de caixas enormes, limpando banheiros sujos e cozinhando espaguete para toda a equipe de mudança. Não que a ajuda estivesse errada, mas ela não veio do meu coração!

A ajuda não veio do meu coração… Aqui temos a chave, a diferença que faz diferença: dar a partir da necessidade de agradar e do medo de não ser amado ou dar a partir do genuíno desejo de ajudar. Dito de outra maneira, trata-se de saber quando a nossa ajuda está baseada na abundância – e na confiança de sermos queridos e aceitos pelos demais – ou, pelo contrário, na escassez e na dúvida sobre nosso valor como pessoa.

Mas… e como saber?

Reconheço que na vida real nem sempre é fácil fazer a distinção que sinalei acima. Por vezes, estamos tão acostumados a colocar as necessidades dos outros em primeiro lugar que temos dificuldade em perceber qual é o nosso verdadeiro querer dentro de cada situação.

Por isso o primeiro passo é prestar atenção às nossas sensações. Quando ajudamos compulsivamente tendemos a sentir que nossas energias estão sendo drenadas, uma vez que para fazer o que o outro pede estamos passando por cima de nossas necessidades. Outra pista importante é dada pelo sentimento que temos ao ajudar. Sentirmo-nos ressentidos e acharmos que estamos sendo usados e que as pessoas abusam de nós é um alerta importante indicando um desequilíbrio em nossas relações.

O cuidado consigo como prioridade

Ser bom demais pode ser bem ruim

E claro, o passo mais importante de todos: decidir cuidar de nós mesmos em primeiro lugar, reconhecendo nosso direito legítimo de priorizar o nosso bem-estar.  Dedicar-se a estar bem consigo, a saber o que se necessita a cada momento e a desfrutar do prazer de atender às próprias necessidades e desejos, é algo essencial para quem deseja estar em equilíbrio, tanto internamente quanto nas suas relações com as outras pessoas.

Não estou lhe propondo transformar-se numa pessoa fria, que não pensa nos demais e nunca se dispõe a ajudar  porque está sempre absorvida pelos próprios problemas. Não estou dizendo isso e mesmo que estivesse tenho certeza de que isto não teria nenhum efeito, porque sei que este não é o seu estilo.

Estou buscando chamar sua atenção para o fato de que  sua vida, para ser uma vida autêntica, deve ser vivida tendo você – suas necessidades, aspirações  e desejos – como o parâmetro das suas ações. À medida que se acostumar a agir assim você perceberá que quanto mais cuida de si mesmo(a), mais energia e disposição tem para ajudar verdadeiramente as pessoas que ama, sem se sentir magoado(a), com raiva ou sobrecarregado(a) por essa ajuda.

E agora, algumas dicas

Autocuidado é prática. Requer atenção para identificar reações automáticas, disposição, para mudar e tentar algo novo e compreensão, para entender que a mudança não ocorre do dia para noite e que sempre haverá recaídas ao longo do caminho. Aqui algumas das coisas que você poderia tentar nesse aprendizado:

Ser bom demais pode ser bem ruim

#1. Faça uma lista das coisas que você deveria fazer para si mesmo(a) e que vem adiando

Você tem ido ao médico para fazer seu check up? Tem conseguido se exercitar regularmente? Como anda o cuidado com a sua alimentação? E tempo para um hobby ou outra atividade de lazer? Se você está constantemente sem tempo para fazer essas coisas, a chance é que boa parte do seu tempo esteja sendo ocupada pelas prioridades das outras pessoas.

2#. Comprometase com suas prioridades

O simples fato de escrever sua lista irá lembrá-lo(a) daquilo que é importante para você. Assumir o compromisso de realiza-las lhe ajudará a colocar limites e dizer não às demandas externas quando estas  lhe parecerem excessivas ou inadequadas.

#3. Identifique e revise suas crenças

Na base do comportamento de ajudador(a) compulsivo(a) encontram-se crenças antigas (e nunca questionadas) sobre dinheiro, egoísmo e outros temas. Vejamos alguns exemplos: “Se não ajudo a minha família, sou uma pessoa egoísta”, ou “para merecer algo, devo dar muito em primeiro lugar”. E, talvez ainda mais fortes e mais enraizadas, as crenças sobre dinheiro: “os ricos são egoístas” “Só se ganha muito dinheiro às custas dos outros” e por aí vai. O fato é que estas crenças nos foram inculcadas pela cultura e a maioria de nós simplesmente as assimilou como verdades e se deixou guiar inconscientemente por elas.

#4. Trabalhe no seu desenvolvimento pessoal

Todos nós temos problemas em relação à nossa autoestima, momentos de dúvida sobre nosso valor e crenças limitantes, inculcadas pela cultura e pelo ambiente em que crescemos. Nada disso é exclusivo das PAS. Porém, sendo tão empáticos e tendo tão fortemente a tendência a sentir tudo com muita profundidade, estes temas podem afetar nossa vida de maneira particularmente intensa. Por isso, o compromisso com o autoconhecimento e o desenvolvimento pessoal é um imperativo para as pessoas altamente sensíveis. Somente identificando nossos pontos frágeis e aprendendo a lidar com eles estaremos aptos a desfrutar das muitas vantagens que a alta sensibilidade nos outorga.

Espero que este artigo lhe seja útil. Sei por experiência própria que este tipo de processo não é nada simples, porque implica em nos desfazermos de camadas e camadas de comportamentos padronizados. Porém, viver pode (e deve) ser, sobretudo, uma experiência de aprendizagem, capaz de nos levar a níveis mais altos de efetividade e bem-estar. E desejo que estas reflexões possam contribuir, ao menos um pouco, com o seu processo de aprendizagem.

Se você quiser fazer contato comigo, escreva para rosalira@amesuasensibilidade.com.br ou preencha o formulário de contato. É sempre um prazer para mim receber seu feedback. E claro, fique à vontade para deixar um comentário.

E, se quiser saber mais sobre como trabalhar no seu processo de equilibrar a sua alta sensibilidade, clique aqui para saber mais sobre o meu Programa de Coaching para Pessoas Altamente Sensíveis. Para assinar a minha Newsletter e receber mensalmente as atualizações do blog, basta clicar na imagem abaixo.

Beijos e bênçãos,

Rosalira dos Santos

Este texto faz parte da nossa coluna, mas está publicado originalmente em: amesuasensibilidade.com.br

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